Quem sou eu

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Alguém que ama a vida e odeia as injustiças

18 julho, 2010


O sorriso

Creio que foi o sorriso,

sorriso foi quem abriu a porta.

Era um sorriso com muita luz

lá dentro, apetecia

entrar nele, tirar a roupa, ficar

nu dentro daquele sorriso.

Correr, navegar, morrer naquele sorriso.

Eugénio de Andrade

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Words

Words


Words are deeds. The words we hear
May revolutionize or rear
A mighty state. The words we read
May be a spiritual deed
Excelling any fleshly one,
As much as the celestial sun
Transcends a bonfire, made to throw
A light upon some raree-show.
A simple proverb tagged with rhyme
May colour half the course of time;
The pregnant saying of a sage
May influence every coming age;
A song in its effects may be
More glorious than Thermopylae,
And many a lay that schoolboys scan
A nobler feat than Inkerman.

William Charles Wentworth


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"
As pessoas afivelam uma máscara, e ao cabo de alguns anos acreditam piamente que é ela o seu verdadeiro rosto. E quando a gente lha arranca, ficam em carne viva, doridas e desesperadas, incapazes de compreender que o gesto violento foi a melhor prova de respeito que poderíamos dar."




(Miguel Torga)
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04 julho, 2010

Alice



Alice

Alice crua de sonhos vagueia na rua dos sentidos. Percorre-a sem olhar. Sente. Sente apenas. Sente o enrolar das tripas. Sente o fardo das pernas. Sente o suor gotejante. Sente o bafo quente da tarde a enrolar-lhe os sentidos. E o suor que a empapa e, o trago amargo da fome a vomitar-lhe a boca. E a tarde a secar.

A rua, a casa. Traves e tijolos, pó e calçada. Tudo gira. Uma neblina tolda-lhe os olhos. Esfrega-os. O suor teima em cair. As costas das mãos estão molhadas. Passa-as pelos lábios. Sabem a sal. Tem sede.

A língua, a ponta humedece os lábios secos tal como a boca. Só o corpo está húmido. Húmido e melado. Respira com força. Mais um passo aqui, ali, em frente, em frente. O caminho de sempre.

O ar escoa-se por entre as varandas vestidas de roupa. Há sons que se diluem no vento morno. São vagos. Cheiram a dor. Sabem a amargo. Os sons desnudaram-se. A tristeza vestiu-se.

O tempo parou na calçada crua. Alice caminha. Detém-se na porta semi-aberta. Empurra-a. A escuridão de bafo quente envolve-a. Uma voz perdida pergunta:

-Quem é?

-Sou eu, a Alice.

-Estava à tua espera.

-Eu sei, eu vim. Sem nada, mas vim.

-Ah! Para quê, então?

-Trouxe-lhe uma côdea do ontem.

-Ah!


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25 junho, 2010


Somos mais pais do nosso futuro do que filhos do nosso passado.

(Miguel de Unamuno)

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24 maio, 2010

Maio

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiTKsaoiplr_i-i91sqpBeEAQlzaspkom-UYJSOHJ-JPo-7yDOP9mgp0-xVh6zgmLRPliaMcL9sKMCCaOc0sal0wMhmcIPsyXs0WyT-m0Kd6MJ81AfZlqKC9n3nxi2lNDB0DkYe2LOwFgQb/s1600/576974_76.jpg


Maio

Senta-se diante da tília que se agita suavemente na noite doce de Maio. No ar vibra aquele odor suave das rosas a desenrolarem-se em saias novas. Maio. Um suspiro.

João velho respira o Maio novo. Tremor e brisa. João e Maio. Gente e Tempo. João respira devagar deglutindo o ar doce que a Tília lhe oferece. Sorri fechando os olhos já cansados. O tempo desprende-se. A Tília envolve-o no seu odor. João deixa-se embalar. Suave, suavemente. Chamam-no. É o tempo. O seu que terminou. O de Maio que vibra. João entreabre os lábios e engole o perfume. Olha em frente, para além da Tília, na curva do tempo onde o mundo nasce de um lado, e morre do outro. É ali que tudo acaba. Sem alarde, embrulhado na doçura de Maio, João parte. Assim serenamente.

Alguém que passou reparou numa tília que chorava ao lado de um velho que olhava sem ver.

Achou estranho mas não parou.

Amanhã era Junho.


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23 maio, 2010



As palavras

São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?


Eugénio de Andrade

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