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A Tapeçaria
Estava gasta e debotada. Pendurava-se no vão das escadas. Entre o primeiro e o segundo lance, quando os degraus espreitavam a entrada da casa, e também os quartos de cima. Era uma grande tapeçaria. Contava uma história tecida nas suas entranhas de seda. As cores tinham-se desmaiado com orvalho do tempo. Mas continuava bela e enigmática. Duas figuras, apenas, no centro. Um velho e uma criança. O pequeno rubicundo, loiro e lácteo, pese a cor acinzentada do tecido. O velho, esguio, de barbicha, olhar penetrante que girava consoante se subiam ou desciam as escadas, como que a ousar penetrar nos segredos da casa. Em redor móveis de madeira velha quase exalando o cheiro a cera, compunham o que parecia um quarto. Na alcova junto à janela de vidros manchados deitava-se uma figura. O artista fora feliz na composição das cores. O rosto esquálido tinha precisamente aquele tom de morte, que arrepia, e torna mais pálidos os primeiros raios de sol que visitavam a manhã. Perpassavam pela janela num adejo de calor para suavizar a pena que se evolava no ar. Pressentia-se o frio e a tristeza, quase a despedida. Na parede em frente repousava o espelho pendurado sobre o baú de madeira maciça, alforge de linhos, e loiças e demais enxoval, exponente da sua condição social. O espelho trazia de volta o movimento que parecia ter parado. Breve silhueta em rotação, o velho ergue o dedo admoestando o pequeno loiro. E o movimento repete-se, lenta e deliberadamente, os dedos tapam os lábios, em obstrução de som. Silenciado o chilreio da criança, afaga-lhe a cabeça de caracóis. Porém a mão continua semi-f.echada e o dedo meio dobrado. O rosto move-se em articulação. Parece conselheiro mais de si do que da criança. De repente, a tapeçaria adeja e as cores agitam-se, a criança, menino loiro, mexe-se, quase que cresce e olha dentro, bem dentro do rosto do velho. O sorriso espalha-se brilhante nas bochechas, parece-me. Oh é apenas o vento. O quadro mantém-se imutável na sua vulnerabilidade de tons e reflexos.
Subo de novo o lance das escadas e olho, aqueles rostos, a luz diáfana ,que bafeja a composição. Essa mesma, vem de fora, em jorro inunda a janela mais a cama ,e vai deitar-se no chão. Há poças de matiz que molham os botins do velho. Ora pretos ora tijolados. O afastar ligeiro de pernas abre novos matizes. Desta vez nas meias que vestem as pernas, e onde se sobrepõem os calçotes escuros. E o velho abana-se ligeiro. Deitando um olhar enviesado para a alcova. Um momento parado de vida. No remanso do quarto, a vida palpita, em interlúdio de matizes de luz.
E perene a tapeçaria descansa sob o olhar da casa.
Texto de participação no 3º jogo das 12 palavras
Saudações amigas
ResponderExcluirUm texto mais poético do que intrincado como o penúltimo. Excelentes, ambos.
ResponderExcluirbj
uma maneira interessantíssima de jogar
ResponderExcluirexercitando a Língua mátrea
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um beijo
Fico com uma vontade enorme de imaginar e tocar uma tapeçarias destas.
ResponderExcluirum beijinho.
Belissimo.
ResponderExcluirSublinho o jogo de luz das tuas palavras.
Um beijo no Azul.
Saudades de aqui voltar à tranquilidade.
PS.: Obrigado pela tua força. Agora tudo está bem.
Interessante!***
ResponderExcluirLi-te no Eremitério, que também tenho participado no jogo.
ResponderExcluirAqui tem mais um sabor, lê-se melhor.
Gostei muito Mateso
Beijo para ti
e como tu "jogas" bem com elas
ResponderExcluirvou ler-te mais abaixo, tenho que pªor a leitura em dia
um beijo
Bom fim de semana
ResponderExcluirSaudações amigas
Resp. Suiça outras gentes outras mentalidades
ResponderExcluirSaudações amigas
jogos de entrar:
ResponderExcluirlugares:
sob o tecto de palavras
con vida!!
beijo