O Inexplicável Mundo Novo!
Sentada na cadeira dos meus
sessenta e seis anos, vejo com inegável espanto o decorrer das ações e alguns
pensamentos dos meus pares humanos que me deixam quiçá boquiaberta, quiçá
espantada.
Senão vejamos:
Vive-se numa sociedade em que a
república de valores igualitários está posta de lado em prol de uma
aristocracia mediática. Os jovens, porque são os mais susceptíveis, lutam por
um lugar não ao sol, mas de likes no instagram e redes sociais a fins. A imagem
seja na vertical, na horizontal, seja de pernas para o ar, seja de cabelos ao
vento ou colados, olhos normais ou estrábicos, todas contam desde que chamem a
atenção e um dedo malandro e viciado coloque o tal likezinho. Supimpa de orgulho, o jovem, o adulto ou o quase idoso
(nestes o facebook é a página de eleição), e com o brilhozinho no olhar, o
sorriso em semi-decúbito a aflorar nos rostos lisos ou riscados do tempo, o
sentimento de afeição de ser querido impera no milhentos instangrianos,
facebookianos, e todos os outros que por ai pululam.
A exposição da vida pessoal não
só afetiva como comercial é mote de negocio de um corso de seguidores ávidos do
seu hipotético dia- que- há-de- vir- de- fama.
Um modo idiossincrático de
felicidade ao jeito do novo milénio.
Mas falando em milénio, os
Milennials (geração Y), os reis e rainhas de toda esta rede de contactos
sociais virtuais, que colam os olhos ao ecrã dos Gadgets mais diversos, aqueles cujos polegares possuem uns quantos
mm a mais de falangetas dado a adaptação às novas techs, aqueles que desde o útero materno (sim, creio, que já lá
dentro se sentam e dedilham algo que lhes permite a incrível destreza polegariana),
pois que logo que eclodem neste inexplicável mundo novo são portadores da
síndrome touchable.
Isto apenas em relação aos Gadgets.
Um Mundo diverso, descontinuo e algo paradoxal. Bem mais preocupante é a
inexplicável sociabilidade da virtualidade, o plágio dos sentimentos e o
inquestionável politicamente correto.
Vamos por partes.
Neste Inexplicável Mundo Novo
despiram-se os fatos da tradição, pelo cheiro bolorento, antigo e retardado e
inovou-se. Inovou-se numa cama de plágio. Na culinária surgiu uma nova a
sinonímia: selamos e confitamos a carne, emulsionamos os ácidos, branqueamos os
legumes, reduzimos os ingredientes, clarificamos os caldos e por aí fora, pois
que continuar seria exaustivo e totalmente insípido. Nada tenho contra o
correto uso da terminologia culinária, é óbvio que a cozinha requer “ciência”
todavia, não exageremos, pois que fazer o que anteriormente se fez, utilizando quantidades
menores numa panóplia de apresentação excelente confecionado com menor grau de
polinsaturados, não significa reivindicar uma “Nouvelle Cuisine”. Perdoem-me o
galicismo, mas soube-me mesmo bem.
Inerente a esta multiplicidade
culinária vem o paradigma dietista. Nos dias de hoje ser forte que não obeso,
porque tal sempre foi considerado doentio, deselegante quiçá desleixado, ser
forte como dizia, significa não preencher os parâmetros de uma tipologia predeterminada.
Hipocritamente e porque é de bom-tom, ou melhor dito politicamente correto,
frontalmente utiliza-se uma verborreia de panaceia, argumentando que o que
interessa é o interior, que as pessoas não se medem pelo exterior. Contudo,
desde tenra idade, o bullying motivado
pelo aspeto físico, em que o peso é um dos fatores, os tamanhos de vestuário e
toda a indústria adjacente, tornam bem claro que os estereótipos imperam e governam.
Comer saudável é praticamente uma obrigação, pois que mais não seja o comum dos
mortais é sujeito a um bombardeio de “comidas saudáveis” que circulam pelos
canais televisivos a par de edições livreiras prontamente alardeadas em escaparates
bem visíveis para quem passa e perpassa no correr da vida.
O ginásio e o corpo perfeito,
fazem-me relembrar o mito grego traduzido na plêiade mitológica. Os deuses do
Olimpo finalmente desceram à Terra no século XXI. Não foi em vão que Zeus
raptou a Europa. Os descendentes, dois milénios depois, ditam os seus
“fabulásticos” mitos. Sejamos, então, obsessivamente míticos neste cantinho à
beira-mar plantado.
Em seguida vem o politicamente
correto.
Tema enviesado por ser labirinto
de ideologias políticas Hoje dizem-se inverdades, denominam-se dignas
profissões com nomes bem dizentes, como se fosse vergonha chamar a um
digníssimo continuo, um trolha, uma empregada doméstica e tantos outros,
necessários à sociedade bem como parte integrante da mesma. Há sim incorrecção
mudar a denominação ao que se faz, desde que não se utilize o pejorativo, pelo
simples facto de um pedantismo vestido de pressuposta correção. Há orgulho em
ser trolha, carpinteiro ou sapateiro tal como há em ser médico, engenheiro,
farmacêutico, etc. Todos são necessários à sociedade. Porquê então mascarar, o
que não necessita de modo algum de disfarce, pela sua intrínseca dignidade? A
meu ver, criou-se uma falácia do tamanho do que se é e não daquilo que vive.
De igual forma é politicamente
correto ser feliz como se a felicidade se multiplicasse à laia da giesta ou da
simples erva daninha. A felicidade, quando alcançada é o resultado muito
complexo de trabalho inexorável, de muita opção de muito tudo. Não é panaceia,
nem lágrima fácil. Tudo é bem difícil neste mundo e os anos ensinam-nos. Logo,
o pior dos erros é criar uma geração no mito de que tudo está sob o clique de
um dedo e que é tangível perseguir os sonhos. Os sonhos são tão fugazes que na
maioria das vezes, nem relembrados são na manhã seguinte. Porém, criar no
espírito dos Milennials que o futuro é o produto de fatores estrategicamente
trabalhados e que deste modo serão tangíveis, creio ser uma forma positiva e
honesta sem inverdade de abrir a vontade dos nossos filhos ou netos de acordo
com a precocidade que cada um dos mais velhos teve.
É politicamente correto não
mencionar as escolhas de género ou de raça. Neste tema, por demais sensível,
penso que cada um de nós deverá caber a escolha e a narrativa adequada, todavia
firme. Casais homossexuais, lésbicos ou heterossexuais devem ter exatamente o
mesmo tratamento desde que as três tipologias revelem comportamentos
socialmente adequados. Na mesma linha, penso que a denominação de negro não é
pejorativa. A raça negra existe, ao passo que a raça branca não existe, mas sim
a caucasiana. Logo o invés e revés do racismo nominal. Naturalmente que a
denominação da raça não cabe na essência humana que habita em cada um de nós.
Assim, antes de sermos diletantes no comportamento caucasiano versus negro ou
negro versus caucasiano, sejamos, antes de tudo Seres Humanos de qualidades e
defeitos. Tão revoltante é o caucasiano que bate no negro ,como o negro que
assalta o caucasiano. Ambos são paradigmas de uma sociedade cujos valores
morais se vêm perdendo enquanto se corre na busca do mítico politicamente
correto.
Finalmente e porque este corolário
de pensamento se vem já alongando demasiado. A incompreensível personificação
dos animais. Todo e qualquer animal é um ser vivo e como tal deve ser
qualitativamente tratado. Mas há uma diferença que ocorreu algures aquando da
evolução das espécies. O Ser Humano é um Ser Racional conquanto o animal é um
Ser Vivo Irracional è verdade que os animais são extremamente amigos e dóceis.
Que fazem companhia a quem está só que são um motivo de alegria. Tudo isso é verdade.
Não concebo que sejam maltratados, que não tenham os cuidados veterinários,
alimentares e de higiene. Que não lhes seja dispensado carinho e conforto.
Também não concebo que se chamem, no caso especifico dos cães, Dianas, Alices,
Marcos e Josés, entre tantos outros. Animal é animal, pessoa é pessoa. Se tanto
mitificamos o corpo, se tanto mediatizamos a imagem, para depois em termos de
personificação nos confundirmos com os nossos animais. Perguntar se um cão ou
cadela é menino ou menina, é incrível. Será macho ou fêmea. Se entramos neste túnel
de personagens trocadas. Será que devemos perguntar a um jovem casal de pais: “.Como
está o seu bebé - cria? É macho-menino ou fêmea-menina? Há que existir uma
certa contenção. O extrapolar, por vezes, trás em si consequência nefastas. As
gerações X e os Milennials têm que pensar que o mundo não será eternamente
deles, pois que um dia também se sentarão na cadeira ou num qualquer outro Gadget
decorativo aquando dos sessenta e seis e aí dedilharão uma reflexão bem mais
corrosiva do que esta” baby boomer”
efetuou sobre o Inexplicável Mundo Novo.
23 Fevereiro 2020
Maria Teresa Soares