Bom... Vejamos: durante quase 39
anos leccionei, obviamente que na Escola Pública. Tive, como superiores
hierárquicos não sei quantos ministros correlativamente não sei quantas
alterações programáticas, um novo acordo ortográfico, acréscimo de disciplinas,
redução de tempos lectivos a certas disciplinas, entre elas a que sempre
leccionei, aumento da carga horária para os docentes, diminuição de conteúdos
programáticos, aumento de floreados, diminuição da substantivação e valorização
da adjectivação. Perdoem-me, porém é assim que defino o ensino nestes últimos
vinte anos. Melhorou substancialmente na sua matriz após o 25 de 74 para recair
numa confrangedora crise a antever a nacional com que vivemos. No entanto, devo
salientar que a par destas alterações de acordo com o sobe e desce das
respectivas facções políticas, a Escola Pública portuguesa, e é bom que se
diga, sempre viveu carenciada. Coube aos professores desde o 1º ciclo ao
secundário fazerem flores, muitas vezes, com as sementes já secas. Quantas
vezes paguei do meu bolso as fotocópias, comprei livros (sim comprei porque nem
sempre as editoras são beneméritas ai ponto de nos ofereceram exemplares
necessários a consulta), quantas vezes, nas manhãs de Inverno, devo dizer, que
vivo numa cidade mais próxima da Europa, (logo devíamos ter outras influencias,
mas tal não acontece) dei aulas sem aquecimento porque o estre acabara e não
havia verba; quantas vezes (sendo eu alérgica ao giz) e como sou da velhíssima
guarda, aquela "chata" que escrevia muito no quadro, fiquei com as
mãos feridas, quantas vezes os alunos mais carenciados não tinham os livros de
exercícios necessários, nem por vezes os manuais, se acaso não eram
beneficiários do 1º escalão, quantas vezes e sobretudo nestes últimos seis anos
vi adolescentes cheios de fome à segunda-feira, limpando literalmente os pratos
porque o fim-de-semana foi como se sabe. Quando as novas tecnologias invadiram
as escolas, coisa boa, houve uma melhoria a qual rapidamente caiu no marasmo.As
verbas destinadas à prossecução desses objectivos, perderam-se algures entre o
Terreiro do Paço e a Cinco de Outubro num trânsito caótico e apressado de
desejos mais ainda de que de vontades. Pois, digo e afirmo, o ensino público
sempre foi mais carenciado do que o próprio país. Coube a gerações e gerações
de professores a tarefa grata ou ingrata, de acordo com o ponto de vista, fazer
flores. A sociedade habituou-se a isso, os governantes habituaram-se a exigir
isso, e nós, tolos, sempre abanamos com as mãos (o resto não, ainda não
chegamos lá) porque ensinar era uma paixão, um dever, um Desidério.
Como sou sexagenária, ainda
frequentei o dito colégio por alguns anitos. Naturalmente que meu pai, homem
impulsivo e contestatário pagava religiosamente as mensalidades ( as quais não
eram tão baixas assim), e sendo um cidadão do “contra” nunca lhe passou pela
cabeça exigir um subsídio, pese o facto de sermos elementos de uma classe média,
desprovida de muitos "gadgets", o que hoje não acontece aos optam
pelo Privado. Tem este, toda a viabilidade em lugares onde o público não chega.
Faz parte da Constituição Portuguesa o direito ao ensino (Capítulo IV, art.º
73º,1.º, e 74º,1,3,alínea a) a g) e o 75º. 1.º , 2º. Seria bom, que os
governantes vertessem preto no branco os articulados mencionados, pois que
muito disparate seria evitado, penso eu. Em resumo, o dinheiro, o nosso
dinheiro de contribuintes deverá sempre ser útil nas Res Publica, porque assim
o determina o conceito de Estado, e não ser aplicado em segundas vias, isto é
em Res Privada Sejamos intelectualmente honestos e deixemo-nos de hipocrisias,
apenas porque é de bom-tom... Ou como se ousa dizer... " Um direito de
escolha".