Em Setembro.
Vinham não se sabe de onde. Vinham trazidas pelo vento, novelos de algodão mal embrulhados que, se sentavam no ar, olhando de cima para baixo, à espera não se sabe bem de quê.
Saber, sabia-se, mas esperava-se. Esperava-se então pelos sinais.
Sinais de Setembro.
Entretanto a neblina avolumava-se nas manhãs por acordar, porém displicente esvaía-se logo que o Rei se punha a circular. O vento, esse, porque era traiçoeiro bufava de vez enquando, de mansinho, mas lá ia despindo uma folha aqui, outra ali, ou pior, simplesmente sugando-lhes o resto de seiva. E a terra cobria-se de amarelo de despedida.
Depois, a varinha mágica estremecia e as cores rebentavam de ser. Um esplendor. Uma paleta. Nas árvores, pelos montes ou nos bardos, o vermelho e o rosa velho, amarelo e o laranja, o grená casado com o ouro velho e o verde amarfanhado. Que panóplia! O olhar guloso bebia-as compulsivamente, tal como o bêbado sorve o líquido. Os sentidos acalmavam, por instantes. Em frente no monte que vestia a cidade, a urze tomara tom. Ao longe parecia açafrão. Aquele amarelo bebido de sol da tarde aquecia os olhos. Um aboboral maduro, assim era os amarelos espargidos na terra amornada de luz.
Liquefeitos os sons do vento evocavam a dádiva do tempo, o presente. O espírito jazia ali mesmo na dobra, entre o antes e o depois, soltando-se na despedida e acenando à chegada.
Verão e Outono.
Sol e neblina.
Riso e sorriso.
Respirava-se o ar e bebiam-se os primeiros pingos de chuva. Refrescava-se. Exauridos os cravos-da-índia, amarelos, vermelhos e castanhos cujo odor forte se desprendia no canto do jardim, acordavam da letargia que os tomara e multiplicavam-se numa rapidez apressada. E no dia seguinte já sorriam alegremente. Nas árvores, os figos maduros e leitosos piscavam matreiros o olho às mãos, que os procuravam.
Oferenda mélica entreaberta em gomos amarelos rosados.
Feneciam as folhas. A despedida.
Letargia. Segredo.
Em Setembro.
Aranjuez Mon Amour - Gheorghe Zamfir
Um deslumbramento luxuriante para o olhar este 'Outono' da fotografia que escolheste para complementar teu texto, expressivo e solto em sinestesias esplendorosas!
ResponderExcluirSaio daqui um pouco melancólica! É que apesar de apreciar profundamente a paleta de tonalidades outonais, os aromas mais serenos... eu adoro o verão! As manhãs brilhantes, luminosas, os dias longos, o cheiro a maresia, as leituras em final de tarde frente ao oceano.
Um beijo,
Que imagem escolheste! E o texto perfumado...
ResponderExcluirMateso Azul, em setembro te superas...
Beijocas.
Mais um texto poético
ResponderExcluironde gosto de repousar
os olhos
As estações do ano são assim
um ciclo de marés
Belo
Muito visual, a sua escrita. E conseguida.
ResponderExcluirImagem e texto irrepreensíveis.
ResponderExcluirMagnífico, querida amiga, vir ao teu blogue é sempre um momento especial.
Um beijo.
Belo texto
ResponderExcluirembrulhado numa imagem lindíssima!
Cumprimentos meus.
Lindo! Repleto de magníficas cores e deliciosas sensações.
ResponderExcluirCom o teu texto, Setembro vale a pena :))
Um beijo