Mulher
No coalhar do humor fez-se dura. No cortar, aprendeu o vazio do gesto. No servir, a elasticidade do sorriso. Maria personagem acesa de um mundo vivo. Vai nos trinta anos. Nas mãos agarra o mundo que pretende, que a cobiça dos olhos lhe mostra. Não é singela, porque o atavio a veste do despudor da mente. Corre frenética pela estrada do hoje, porque o ontem morreu na esquina da inveja. Nos lábios trinca o sorriso macio do bem gerir. Gere as emoções na tábua lisa dos interesses. Há que chegar, há que subir a montanha. Pelo caminho escorrega nas escarpas. Os golpes não a incomodam. O cansaço não é nada. Depois, quando lá chegar, poderá descansar. Antevê a glória do domínio. A vitória lateja-lhe no espírito. Maria…
Dança-lhe o desejo no olhar. Nas mãos, articuladas de gestos, brincam-lhe os dedos. Nos braços, compridos, fremem-lhe as veias, no pescoço correm-lhe os anseios e no colo moreno suspiram-lhe os frémitos. Maria …
Percepciona o mundo à dimensão do seu ego. Forja as vidas. Usa as pessoas. Serve-se delas. No cinismo pessoal jaz a sua glória manipuladora. No permeio fica um sorriso meio doce que forra uma voz macia. Maria sabe o que quer. Sempre soube. É uma sobrevivente.
Maria tem uma história. Banal. Maria ri da sua vida. Ri da vida, que não de si. Maria é firme. Afila a vontade e varre a emoção. Chorar? Gritar? Já o fez. Hoje bebe a vida em golfadas, e, cospe-a em desprezo. Está saciada. A predadora e a sua presa. Quem diria? Maria…
Maria é mulher. Foi amante. Maria é mãe. Foi filha. Maria amou. Não foi amada. Maria joga. Foi jogada. Na raiva do ontem estende-se o delírio do hoje. Engendra, desfaz, corta, compõe e sorri. A fila de anões jaz a seus pés. Anões babados de olhares turvos e génios perdidos. Peões varridos. Maria acaricia as suas criações. E ri, ri diabólica. Maria…
Maria é fêmea. Ondulante lança-se no jogo do homem. Ganha. É forte. Vangloria-se. De face escondida. A outra, a que revela é contida., diria serena. Saber urdir é arte. Maria é artista, não de palavras ou paletas mas de emoções. Maria faz e desfaz vidas. Maria ri, ri, em esgar de vitória
Maria chega ao topo. Olha , o mundo a seus pés. Ergue o braço e grita. Venci!
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Maria é mulher!
ResponderExcluirum bjo
A força deste texto, de cada frase, que ritmo, magnífico!!
ResponderExcluirVou ler outra vez! Apetece-me.
Estupendas essas Marias... A personagem e a autora, a criatura e a criadora.
ResponderExcluirA seus pés, Mateso.
Beijocas de Selma Barcellos
uma personagem cheia de força.
ResponderExcluirGosto deste retrato de Maria, que bebe em golfadas e cospe em desprezo... (Deprezo de si própria, que bebe em golfadas o que lhe dá vómitos? Ou desprezo de si própria, que vomita o que bebeu em golfadas?).
ResponderExcluirMaria é infeliz. Quem tem faces diferentes não pode nunca usar as duas ao mesmo tempo, não pode nunca ser quem é.
Maria é tonta. Quando tropeçar na pedra da calçada (onde toda a gente tropeça um dia), Maria não terá quem lhe dê a mão ou ampare a queda.
Maria não é mulher nem homem, é gente. Infeliz. É pena, haver tanta Maria no mundo.
Hélas!
maria vinga-se. acho que mal.
ResponderExcluirpelo caminho mais fácil, embora não isento de arte, como dizes.
mas magoa-se. muito.
acorda a tempo?
[ belo perfil escrito, mateso
beijo
A predadora e a sua presa. para quem já foi presa o reverso será vitória.
ResponderExcluirA selecção natural não será também isso?
Uma Maria cheia de génio e de vontade, ou a arte de sobreviver.
Um beijo
enorme
E quem és tu Maria, que soltas a tua raiva quase doentia, ou a triste sorte que se escreve a cada passo deste fruto teu?
ResponderExcluirGosto desta Maria.
ResponderExcluirNão fica a lastimar-se nem a ter pena da sua sorte.
Joga com o que aprendeu.
Mas de per si, serena...
Um beijo Mateso.
Intenso, como sempre.
urdiduras de mulheres esculpidas na arte suprema de bem escrever
ResponderExcluir.
o beijo que faltava ,miúda!