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Alguém que ama a vida e odeia as injustiças

14 setembro, 2017

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Ser velho, idoso, gasto, depauperado, enfim já vivido!

Agostinho é vivo, ardiloso, galante e quiçá quase, quase mulherengo. Agostinho ronda os setenta e muitos. Quem o vê, nota um idoso enxuto, encarquilhado, vacilante, mas de olhar saltitante. Ainda suspira quando passa perto de uma mulher jovem. A sua libido ainda borbulha. Dizem, os malsabidos que os velhos não sentem, são inseguros e pranteiam. Agostinho lacrimeja do pó dos anos, suspira nos dias da Primavera e abre o coração nos dias dourados.
Num dia destes, Agostinho pegou na motoreta, pôs o capacete e foi de passeio até à praia. Não gosta de filas e muito menos de autocarros e elétricos contorcidos de gente com rosto de maçãs verdes. A fruta que Agostinho prefere é o pêssego. Bem maduro, saboroso, meloso e com aquele fio de sumo a pingar pelos beiços. As maçãs verdes e ácidas destes tempos arrepiam-no. Por isso não gosta dos autocarros, sempre cheios e ácidos. Estrídulos como a fruta verde.
Devagar porque a pressa é para quem ainda não vivei e teme pelo tempo, chegou à praia. Espraiou-se na esplanada de um café. Não esborrachou o rosto no ar porque não existia parede de ansiedade. Semicerrou o olhar e apreciou o mulherio. Esbeltas, corças jovens; redondas, leoas de família; as mais velhas de pé aqui, salto ali, uma torcer mais um endireitar provocaram-lhe o sorriso nos lábios finos dos anos. Gostou. Afinal, as mulheres mais despidas ou mais vestidos mantinham aquele jeito de séculos, a sedução. Agostinho reclinou-se e voltou a razão para os jovens desarticulados que se espremiam em olhares e trejeitos perto das corças como se fossem olharapos em andança. Estava satisfeito. Beberricou a sua imperial, recostando-se na cadeira de plástico verde.
Agostinho pensou então como era feliz por ser velho, idoso, depauperado enfim vivido. Ele, o velho, tinha no corpo e na razão o cofre dos anos vividos, o olhar das coisas belas, ele não precisava de descobrir e experimentar, porque sabia. Afinal, concluía Agostinho:
A vida era mesmo um pêssego rosado e suculento. Abaixo a maçãs verdes é acidas. Que feliz estava por ser velho!

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